
Começar com HENDRIX, apesar do conjunto dos seus pedais ser simples, é possivelmente das tarefas mais árduas.
Tenho consciência que à medida que o tempo do seu desaparecimento se alarga, as novas gerações menos compreenderão a grandeza do seu legado na História da Música Ocidental do séc. XX.
Este artigo será a minha tentativa sóbria de tentar mostrar o lado que poucos conhecem… o lado mágico… enfim… o que tornou HENDRIX no maior ícone da guitarra até hoje!
Naquele tempo… o rock era limpo e contido: sem feedback, sem grandes distorções, sem grande atitude na postura, etc. …
Ora Jimi Hendrix era negro, usava alguma roupa feminina, tocava com os dentes e atrás das costas, simulava a masturbação com a guitarra, partia e queimava a guitarra nos concertos… estava-se a sair dos conservadores anos 50!
GUITARRAS
Em 1959 seu pai compra-lhe uma guitarra barata. Ao longo do tempo vai trocando de guitarras por outras melhores. Chegou a comprar uma Ibanez, mas devolveu a guitarra voluntariamente por não conseguir pagar dez dólares por semana.
Em 1964, Hendrix obtém a sua primeira Fender, mas é no Verão de 1966 que entra no mundo das Stratocaster CBS com pau-rosa na escala. Jimi teve inúmeras Stratocasters e chegou a levar mais de treze em tournée.
Hendrix comprava guitarras para dextros, sendo ele próprio esquerdino, porque preferia ter os potenciómetros por cima. Jimi invertia o pente e enrolava a corda Mi (grave) na direcção contrária para tentar evitar que a corda saltasse da ranhura do pente. As Fender da era CBS (fase negra da Fender) tinham muitos problemas tais como captadores vibrafónicos, cordas que saltavam do pente, maus acabamentos e má ferragem. Por esses motivos Jimi e outros guitarristas tinham de inventar técnicas para superar o mau fabrico.
As outras guitarras menos usadas eram: Gibson ES-330, Gibson Firebird, Dobro Mosrite, Guild acústica de 12 cordas, acústica Black Widow Spider, Mosrite de dois braços, baixo Hagstrom de 8 cordas (usado na “Spanish Castle Magic”), Rickenbackers (baixo, guitarra de seis e doze cordas), uma Gretsch Corvette de 1967, Guild Starfire Deluxe para esquerdinos com trémulo Bigsby, Gibson Flying V 67, Gibson Les Paul 55, Gibson SG Custom 68, Flying V preta para esquerdinos, acústica Gibson Dove, acústica Martin e uma Hofner eléctrica. As modificações eram mínimas e os trastos raramente eram mudados porque as guitarras não duravam o tempo suficiente.
CORDAS
Há rumores de que o conceito ou o conhecimento massificado de diferentes calibres de corda veio de Jimi Hendrix. Ele usava cordas.010, .013, .015, .026, .032, .038 da Fender. Certo dia ao partir-se a corda Si, Jimi confessa usar a Mi aguda no lugar da Si. Terá sido a primeira que alguém tem conhecimento que havia gente que fazia o seu próprio jogo de cordas.
O baterista Buddy Miles e alguns dos guitarristas que experimentaram as suas guitarras diziam que Hendrix usava um Mi grave muito forte, um Lá e Ré médio, uma corda Sol Havaiana, um Si leve e um Mi agudo muito leve. Esta mistura de calibres vinha da ideia pessoal que Hendrix tinha em relação ao melhorar da afinação do instrumento.
Outra característica típica era a afinação usada: no início usava a tensão e afinação regular, mas passou a baixar meio-tom para facilitar o seu desempenho vocal.
OS AMPLIFICADORES
O Hendrix experimentou vários tipos de amplificação, mas pode-se dizer que foi 99% Marshall. No início usou amplificadores de marcas menos conhecidas, passou pelos Fender mas não conseguiu tirar o som que queira deles!
O seu som vinha de três cabeças Marshall (100-watt Super Lead) e seis 4x12. Ligava a guitarra num desses amplificadores e os outros através da entrada adjacente do primeiro para o segundo e assim sucessivamente.
Como o guitarrista abusava bastante, o material durava pouco e por isso pediu para trocar os altifalantes de 25W Rola Celestion por 75W.
Jimi tinha preferência pelas válvulas 6550 da Mullard e os seus amplificadores tiveram de ser modificados para manter essas válvulas a funcionar correctamente.
OS EFEITOS
Naquele tempo os efeitos estavam a surgir. Hendrix ouviu um wha-wha pela primeira vez nos Cream e o efeito (Vox) passa a fazer parte da sua corrente sanguínea.
Em 1967 conhece um construtor de efeitos chamado Roger Mayer em Londres.
Enquanto o wah-wah da VOX era a novidade de 1967, havia segredos bem escondidos na “caverna” de Roger Mayer.
Ele constrói um novo efeito chamado Octavia que foi rapidamente usado em temas como “Purple Haze” e “Fire.”
Jimi Hendrix, além do seu talento, adquiriu um som impossível de igualar naquele tempo. Até Eric Clapton quando o viu ficou sentado numas escadas em choque pensando em nunca mais voltar a tocar! Não se sabia o que aquele homem fazia à guitarra, a potência era de proporções bíblicas e os sons que dali saíam eram do outro mundo! Porquê? O que tornava o som tão diferente do que fora ouvido até então?
Para começar, o efeito Fuzz tem a particularidade de dar a sensação que o Mundo vai desabar se for usado em níveis consideráveis. Juntemos um Octavia e passa-se a ter mais uma oitava em cima desse som. Agora imaginem três amplificadores ao rubro a levar com este sinal todo!!!
Mayer fez umas 15 versões depois do primeiro. Dizia ele que algumas só duravam uma semana… só no final de 1967 no álbum Axis: Bold as Love se pôde ouvir a versão final do Octavia. Ouçam com acuidade e reparem na clareza e detalhe do efeito.
Ainda em 1968 o efeito só era usado em concertos especiais, pois eles tinham medo de serem roubados. Nunca se perdeu um Octavia porque Jimi e Mayer levavam o pedal com eles a toda a hora. Naquele tempo os pedais eram roubados frequentemente (pelas pessoas que assistiam aos concertos, roadies, etc) e por vezes eram atirados pelo próprio Jimi como presentes.
Apesar do Fuzz principal de Hendrix ser o famoso Arbiter Fuzz Face, Mayer diz que fez uns dezassete Fuzz e um número indeterminado de Octavias para Jimi Hendrix.
Diz a lenda que o guitarrista teve um sonho em que ouvia a guitarra debaixo de água e Roger Mayer apresenta-lhe aquele que iria ser o grande ingrediente: Univox Uni-Vibe.
Um Univibe é um modulador que merecia uma categoria por si só. Basicamente é um “phaser” de quarto fases. A velocidade e o efeito são controlados por uma lâmpada giratória. À volta dessa lâmpada estão quarto sensores que capturam a intensidade e a velocidade para as quatro fases do faseador.
O Univibe tinha alguns problemas uma vez que o sinal, mesmo tendo o pedal desligado, atravessava sempre o circuito causando um som mortiço e uma ligeira redução de volume. Esta unidade tentava simular um altifalante rotativo (que Hendrix se fartara pelo seu tamanho e peso incómodo e pouco prático).
Completa-se o conjunto de pedais lendários: VOX Wah-Wha, Octavia, Arbiter Fuzz Face e Univox Uni-Vibe.
NOTA FINAL: Tirando o Octavia, todos os efeitos estavam ao dispor de todo o planeta. E… todo o planeta e várias gerações não chegaram para fazer nascer outro Jimi Hendrix.
Eu próprio tenho curiosidade em saber como iria soar a música dele com as novas técnicas de captação e de melhoria na engenharia de som. Nunca fui muito fã da captação e mistura dos anos 60. E ouvindo o guitarrista por essas sessões e concertos, garanto que não é justo!
Quando ligamos um bom Fuzz num grande amplificador na guitarra certa, sentimos o diabo a trincar-nos o rabo!
Sejam um pouco Hendrix na vossa vida!